"Você já
gostou muito de alguém?", ele me pergunta enquanto encara as gotas que
escorrem pelo vidro da janela. Minha vontade é dizer que sim, e estou gostando
nesse momento. Mas ele não ia entender, ou ia fingir que não era sobre nós.
Então ele começa a dedilhar o violão e me encara. Sabe que eu gosto dessa
música. Canto baixinho e desafinada, e ele sorri. Eu só falo sobre ele nos meus
últimos textos e ele nem imagina isso. Finge que não sabe ou até só duvida, mas
eu sei que sinto e tem ficado cada dia mais intenso. Poderia fugir, falar com
outra pessoa, mas algo me prende. Eu não quero mais ninguém. Não há outro
sorriso e olhar que me faça querer ficar. Chega aqui, me puxa de uma vez pros
teus braços, moço. Fala que não importa com mais ninguém e que fomos feitos pra
durar. Ou não fala nada, mas para de ser essa incógnita. Eu não sei o que
esperar disso aqui, mas sei que vai acabar doendo.
- Sim, já...
- e ele sorri.
- Como foi? -
você não sabe, mas ainda está sendo.
- Doloroso. -
Ele larga o violão e chega mais perto.
- Por quê? -
Me questiona com aqueles olhos enormes.
Porque você
não me vê da maneira que eu gostaria. Porque eu daria tudo pra ser aquela que
tira teu sono e te abraça no frio. E eu não sou nem seu desejo embriagado.
Estamos a sós e você nem parou pra enxergar que eu poderia estar em qualquer
outro canto dessa festa sem graça e apenas passei a noite toda do seu lado. Eu
quis tanto ser livre e acabei ficando presa na esperança de um dia ser alguém
especial pra você. É doloroso demais te ver em tantos outros braços quando eu
só queria alguns minutos sendo sua outra vez. Eu me perco nas palavras e
encontro todas novamente quando você para de fingir que nunca tivemos nada.
Quando você se abre e me olha de verdade, ao invés de me encarar apenas por
baixo desses óculos quando ninguém mais está vendo.
- Porque eu
quis mais do que ele me queria. - E eu que dessa vez estou encarando os pingos
dessa chuva que agora parece tempestade.
- E você
insistiu? - ele tira os fios de cabelo que caem sobre meus olhos, e eu me viro
pra ele.
- Só se ele
quiser que eu insista... - automaticamente, como um imã, meu corpo se aproxima
do dele e nossos olhos se encontram. A melodia suave transforma uma cena banal
em cena de novela. Eu sei que deveria me afastar, mas seus lábios parecem uma
boa ideia toda vez que penso em algo doce. É aqui que começo e recomeço toda
vez,é aqui que quero ficar. A chuva que cai lá fora inundou a rua e fez com que
você ficasse. Eu leio isso como um sinal do destino e você acha que foi algo banal.
Atrapalhou sua volta pra casa e deu gás a minha esperança.
- Eu não sei
se posso te pedir isso.- Os dedos deles acariciando meu rosto, ele chegando
perto, nossos narizes encostando. Você pode me pedir o que quiser, meu bem. Se
quiser ir, eu aceito. Mas se puder ficar, fica e me deixa te fazer feliz. Eu
tenho feito tudo pra que você me note e veja que nossas coincidências vão muito
além do que o gosto pelo mesmo tipo de bebida ou a marca de cigarro.
«Silêncio»
Então me
beija com toda a vontade. Finalmente puxa meu corpo pra perto do dele e me faz
acreditar outra vez. Foi assim que começamos, com um beijo quente numa noite
nublada. E é assim que recomeçamos, com um beijo especial no meio do temporal.
A cidade toda parou pra que o nosso carinho pudesse se concretizar, todos de
dentro de seus carros observando o encontro dos nossos corpos. Todas as ruas
cheias enquanto meu sentimento te inunda. Eu ignorei todas as placas de perigo
e decidi ficar. Eu sei que vou me magoar, mas a dor valerá a pena se eu apenas
tiver mais um pouco de você. Não repara a bagunça que deixaram aqui que eu
finjo não ver essa cicatriz que você tem marcada no peito. E assim vamos deixar
a chuva lavar nossas mágoas para que possamos recomeçar outra vez.
Hoje eu
insistirei.
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